Sucesso de bilheteria e crítica, o drama de Walter Salles provoca reflexões sobre o passado e o presente da democracia brasileira.
Entre bruxas desafiando a gravidade em Wicked e gladiadores lutando até a morte em Gladiador 2, o filme brasileiro Ainda Estou Aqui emergiu como o grande destaque das bilheterias recentes. Dirigido por Walter Salles, cineasta de sucessos como Central do Brasil (1998) e Diários de Motocicleta (2004), o longa lidera os cinemas brasileiros, superando até mesmo os blockbusters internacionais.
Com 1,8 milhão de espectadores, o filme já ultrapassou a marca de Central do Brasil, tornando-se o maior sucesso nacional do diretor no país. Mais do que números impressionantes, Ainda Estou Aqui está gerando uma profunda comoção entre o público e reacendendo debates sobre memória histórica e democracia.
Impacto da narrativa no público
O longa, baseado no romance homônimo de Marcelo Rubens Paiva, filho do ex-deputado Rubens Paiva, aborda o desaparecimento e a tortura do político durante a ditadura militar. A história se desenrola sob a perspectiva de Eunice Paiva, vivida brilhantemente por Fernanda Torres, e sua luta incansável para comprovar a morte do marido e buscar justiça.
Em meio a sessões lotadas, o impacto do filme transcende a experiência cinematográfica. Durante os créditos finais, embalada por É Preciso Dar um Jeito, Meu Amigo, de Erasmo Carlos, aplausos e gritos de “Sem anistia para golpistas” ecoaram em várias sessões.
Para a professora aposentada Rosângela Cavalcanti, o filme tocou profundamente. “É um filme tocante. Leva você a refletir. Fiquei o tempo inteiro emocionada, e no final muito mais,” contou, enxugando as lágrimas ao sair da sessão.
A farmacêutica Suzana Leitão compartilhou um sentimento semelhante: “Não tem que ter anistia. Cadeia neles!” Já o engenheiro aposentado Roberto de Carvalho destacou a atualidade do tema:
“Estamos vivendo uma preocupação com a democracia semelhante àquela mostrada. É uma mistura de angústia e uma boa surpresa, porque o filme é tecnicamente espetacular.”
Walter Salles e o cinema como espelho
O diretor Walter Salles comemora não só o sucesso do filme, mas a reação do público às questões que ele levanta:
“O que mais nos sensibiliza é o fato de o público estar lotando as salas para viver uma experiência coletiva com um filme brasileiro. É uma história de dor, mas também de resiliência e reinvenção,” afirmou.
Salles também reforça a importância do cinema como espaço de reflexão. “As pessoas perceberam que a emoção fica mais forte quando vivida coletivamente. É um prolongamento do cinema como um lugar de desvendamento do mundo.”
Elenco e prêmios: o que faz de Ainda Estou Aqui um fenômeno
Com um elenco estrelado que inclui Fernanda Torres, Fernanda Montenegro, Selton Mello e Valentina Herszage, o filme conquistou reconhecimento internacional, incluindo o prêmio de Melhor Roteiro no Festival de Veneza. A mídia especializada nos EUA já aposta em indicações ao Oscar, incluindo Melhor Filme Internacional e Melhor Atriz para Fernanda Torres.
“Sou uma atriz diferente depois da Eunice,” disse Torres em entrevistas, ressaltando a complexidade emocional do papel. O desempenho dela foi tão marcante que a psicóloga Vera Paiva, filha de Eunice na vida real, admitiu no programa Altas Horas que teve vontade de chamar Fernanda de mãe.
Debate político e contemporaneidade
O lançamento de Ainda Estou Aqui ocorre em um momento de tensão política no Brasil, quando o Congresso debate a anistia de envolvidos nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023. A trama, que questiona o “seguir em frente sem olhar para trás” do pós-ditadura, ressoa profundamente com o contexto atual.
“O desaparecimento é o pior dos lutos. Pois significa a morte de quem se foi e o luto eterno dos que ficam,” comentou a historiadora Lilia Schwarcz sobre o filme.
A atriz e comediante Ingrid Guimarães também destacou a relevância da obra:
“É preciso estar atento e forte pro que virá. E nunca normalizar a barbárie.”
Uma recepção internacional de peso
Além do público brasileiro, Ainda Estou Aqui tem conquistado admiradores internacionais. O ator Sean Penn, vencedor de dois Oscars, elogiou a produção após uma exibição privada, afirmando: “Me emocionou intensamente, carregarei comigo para sempre.”
O impacto também se reflete nas redes sociais. Uma postagem recente da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, com uma foto de Fernanda Torres, alcançou 2,8 milhões de curtidas e 800 mil comentários, um engajamento recorde para o perfil da organização.
Livros, música e além do cinema
O sucesso de Ainda Estou Aqui está ressoando fora das salas de cinema. O romance de Marcelo Rubens Paiva que inspirou o filme voltou às listas de mais vendidos. Já a música de Erasmo Carlos, presente nos créditos finais, vem emocionando uma nova geração de ouvintes.
O filme também é tema de debates na TV e nas redes sociais, com artistas, políticos e acadêmicos discutindo sua relevância histórica e artística.
Marco para o cinema nacional
Com uma trajetória brilhante nas bilheterias e no circuito internacional, Ainda Estou Aqui caminha para se tornar o filme brasileiro de maior sucesso desde a retomada pós-pandemia. A expectativa de indicações ao Globo de Ouro e ao Oscar só reforça seu status de fenômeno cultural.
Mais do que um filme, Ainda Estou Aqui é um convite à reflexão sobre a história e o futuro do Brasil. Uma obra que, ao mesmo tempo, emociona e desperta a consciência coletiva, consolidando o cinema como uma poderosa ferramenta de transformação social.
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